*O ato acontecerá na Câmara Municipal de São Paulo, 07 de fevereiro (quinta-feira), às 19h, no Salão Nobre - 8º andar.
Desde novembro de 2012, d. Pedro
Casaldáliga, bispo emérito da Prelazia São Félix do Araguaia, no Mato
Grosso, vem recebendo ameaças de morte devido à sua luta pela devolução
das terras batizadas como Marãiwatsédé aos índios da etnia Xavante. No
início de dezembro, após a Justiça derrubar dois recursos que tentavam
adiar a retirada dos não índios da região, agora chamada Gleba Suiá
Missú, ele teve de se deslocar contra sua própria vontade para uma
localidade não revelada para sua própria segurança.
Ainda assim, d. Pedro retornou em 29 de
dezembro a São Félix, estando agora sob proteção policial. Porém, além
de Casaldáliga, diversas lideranças indígenas e agentes da pastoral
também estão sendo ameaçados desde que o Incra iniciou o processo de
desintrusão da região.
Breve Histórico:
Com 165 mil hectares (ha) a Terra
Indígena (TI) Marãiwatsédé está localizada entre os municípios de São
Félix do Araguaia, Alto da Boa Vista e Bom Jesus do Araguaia. Estudos
antropológicos comprovam que o povo Xavante já ocupava o território
desde muito antes dos primeiros não índios lá chegarem. Contudo, em 1966
o Governo Militar de Castelo Branco os removeu forçadamente em aviões
das Forças Aéreas Brasileiras (FAB) para cerca de 400 quilômetros de seu
território tradicional, enviando-os para a Missão Salesiana São Marcos,
onde dois terços dos indivíduos acabaram sendo dizimados devido a um
surto de sarampo.
A remoção foi influenciada pela família
Ometto, de origem paulista e então proprietários da Fazenda Suiá Missú,
para que pudessem ampliar seu latifúndio. Os proprietários convenceram
os superiores da Missão Salesiana S. Marcos a aceitarem os índios e a
fazenda se tornou uma das maiores propriedades rurais do mundo, senão a
maior. Documentos da Prelazia de São Félix relatam que desde então os
Xavantes “voltam anualmente a sua terra para apanhar o Pati, árvore por
eles usada na confecção dos seus arcos e flechas”.
Em 1980, no entanto, as terras da Suiá
Missú foram vendidas à empresa petrolífera italiana Agip Petróleo, que
foi pressionada, inclusive internacionalmente, a devolver o território
aos indígenas. Em 1992, na conferência Eco 92, ocorrida no Rio de
Janeiro, a empresa finalmente informou que realizaria a devolução das
terras aos Xavantes. Porém, na mesma semana do evento, o então gerente
da fazenda, Renato Grilo, se reuniu com diversos políticos e
representantes locais no Posto da Mata (distrito de Estrela do Araguaia)
para incentivar a população a se apropriar definitivamente da região.
Na ocasião, estavam presentes o então
prefeito de São Félix do Araguaia (e atual, eleito para a gestão
2013-16), José Antonio de Almeida (PPS/MT), o "Baú", e o advogado Ivair
Matias, além de muitos grandes fazendeiros e a população que começava a
chegar na região. Em gravação da Rádio Mundial FM, registrada em 20 de
junho de 1992, Baú conta à população presente que "em 1966 (os índios)
'foram embora' para uma outra reserva". Dr. Ivair incentiva a invasão
por parte do povo: "vem vindo por aí, caravanas imensas de famílias
(...) aqueles que têm alguma esperança de ver concretizada essa reserva
(indígena), pode 'tirar o cavalinho da chuva'; e isso está nas mãos dos
senhores".
Entretanto, são estes mesmos proprietários que atualmente, em diversas entrevistas, têm relatado à imprensa que nunca tiveram conhecimento de nenhum Xavante na região. Como o ex-prefeito Filemon, proprietário das fazendas Aripuanã e Saraiva, que juntas somam 565,5 ha.
O estudo entre Funai, Incra e Ibama
confirma que apenas 22 fazendas pertencentes a grandes proprietários
ocupam um terço do território, ou 43 mil hectares. “Estas fazendas foram
as principais responsáveis pelo rápido desmatamento da área (...) é a
terra indígena com maior área desmatada da Amazônia Legal, com 61,5% do
território desmatados", aponta o relatório.
Entre os grandes proprietários estão o
ex-vice-prefeito do município de Alto da Boa Vista, Antonio Mamede
Jordão, dono da Fazenda Jordão, com a maior propriedade registrada:
6.193,99 ha; e o ex-prefeito, também de Alto da Boa Vista, Aldecides
Milhomem de Cirqueira, que possui seis fazendas, num total de 2.200 ha; e
o desembargador do Tribunal de Justiça do Mato Grosso, Manoel Ornellas
de Almeida, cuja fazenda tem 886,8 ha.
Também estão entre estes proprietários
os irmãos Gilberto Luiz de Resende, o Gilbertão, e Admilson Luiz de
Resende, responsáveis por incentivar a invasão dos posseiros, o que na
época foi apelidado de “reforma agrária privada”. Gilbertão é citado em
inquérito da Polícia Federal por grilagem de terra, trabalho escravo e
por utilizar capangas para espancar trabalhadores, além de ser dono de
quase 2.700 ha de terras da região. Admilson é ex-vereador de Alto
Taquari e tem três fazendas que somam o total de 6.641,3 ha.
A população mais uma vez é feita de
refém e utilizada como massa de manobra nos ataques contra o povo
Xavante, d. Pedro Casaldáliga e agentes da pastoral. Os conflitos são
inflamados justamente pelos grandes proprietários que, em sua ganância e
poder, passaram a ameaçar Casaldáliga e os indígenas envolvidos com o
processo de desintrusão de Marãiwatsédé.
O Estado Brasileiro também se coloca
como cúmplice dos conflitos na região, quando permite que por mais de
vinte anos estas terras fossem invadidas e os processos judiciais
caminhassem em tamanha morosidade. Também chama atenção o fato de que o
advogado da Associação dos Produtores Rurais da Suiá Missu, entidade que
representa os invasores, é Luiz Alfredo Abreu, irmão da senadora Kátia
Abreu (PSD/TO), representante maior da chamada “bancada ruralista” no
senado.
Durante todo este período o território
Xavante foi ocupadoprincipalmente por poderosos fazendeiros, políticos, e
empresários que se apoderaram de grandes fatias da terra, enquanto os
pequenos produtores eram incentivados a obter áreas de no máximo 100 ha.
Os estudos que identificaram a área foram concluídos em 1993 e a
demarcação do território homologada em 1998, pelo então presidente
Fernando Henrique Cardoso.
Somente em 2004 os Xavantes conseguiram
retomar uma reduzida parcela de seu território após ocupar por 10 meses a
Rodovia BR-158. Mas foi apenas em 2010, após muito tempo entre êxodos e
sofrimento do povo Xavante que a Justiça Federal determinou, em decisão
unânime da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, a saída
dos não índios das terras que compõem Marãiwatsédé.
Apesar de sua indiscutível resistência, o
processo de retomada e permanência dos povos originários às suas terras
é sempre muito árduo e doloroso para os índios. Tem sido assim com os
Guarani Kaiowás, no Mato Grosso do Sul; com os Pataxós Hãhãhãe e
Tupinambás de Olivença, no sul da Bahia; os Tembé, no nordeste do Pará;
entre tantas outras etnias espalhadas pelo Brasil. Também não podemos
esquecer da luta pela preservação da relação sociocultural e ambiental
destes territórios, como tem sido com as mais de 20 etnias residentes na
Bacia do Rio Xingu, ameaçadas pelas obras de Belo Monte.
Como todos estes, os Xavantes batalham e
esperam há mais de 50 anos pela devolução de seu território ancestral.
Sua luta, assim como a de dom Pedro Casaldáliga, é legítima e é também
nossa, e não pode se tornar mais um capítulo entre tantos, cujos
desfechos resultaram em mortes e derramamento de sangue.
Nesse sentido, manifestamos nossa
irrestrita solidariedade ao povo Xavante e a d. Pedro Casaldáliga, que
no próximo 16 de fevereiro completará 85 anos de idade. Pedimos que
entidades em defesa dos direitos humanos, movimentos populares,
sindicatos, pastorais, partidos políticos, movimento estudantil e todos
que lutam e se colocam enquanto sujeitos ativos na transformação da
sociedade estejam em unidade para denunciar a situação de violência e
tensão na região de Marãiwatsédé, que mais uma vez ameaça vidas em nome
da acumulação de capital.
Comitê de solidariedade a dom Pedro Casaldáliga e ao povo Xavante
São Paulo, janeiro de 2013
Leia a carta da comunidade Xavante de Marãiwatsédé à sociedade brasileira:
http://goo.gl/AMr4V
http://goo.gl/AMr4V
Contatos para inclusão de assinaturas e dúvidas:
Paulo Pedrini: pcpedrini@ig.com.br
Alexandre Maciel: alexandre.maciel.silva@gmail.com
Alexandre Ferreira: aleterralivre@riseup.net
Paulo Pedrini: pcpedrini@ig.com.br
Alexandre Maciel: alexandre.maciel.silva@gmail.com
Alexandre Ferreira: aleterralivre@riseup.net
Assinam esta nota:
Agenda Colômbia-Brasil
ACAT Brasil
Casa da solidariedade
Centro Acadêmico Benevides Paixão
CIMI
Coletivo Bancários na Luta
Coletivo Socialismo e Liberdade / PSOL
Comitê Paulista pela Memória, Verdade e Justiça
CORSA – Cidadania, Orgulho, Respeito, Solidariedade e Amor
CSP Conlutas
ECLA – Espaço Cultural Latino Americano
Escola da Cidadania da Região Sul de São Paulo
Executiva Estadual da CSP Conlutas-Tocantins
Fórum das Pastorais Operárias da Arquidiocese de São Paulo
Grupo de Pesquisa em Políticas Sociais - GPPS-Unioeste-Paraná
Instituto Zequinha Barreto
Intersindical
Jornal Voz da Comunidade
Mand. Deputado Estadual Carlos Gianazzi / PSOL
Mand. Deputada Federal Luiza Erundina / PSB
Mand. Deputado Federal Ivan Valente / PSOL
Mand. Vereador Toninho Vespoli / PSOL
Pastoral da Diversidade
Pastoral Operária
PCB
PSOL
PSTU
Rede de Proteção Autônoma aos Militantes Ameaçados de Morte
Sefras – Associação Franciscana de Solidariedade
Sinasefe - Seção Palmas
Sindicato dos Bancários de Santos e Região
Sindicato dos Químicos Unificados de Campinas, Osasco e Vinhedo
SINTARESP - Sind. dos Téc. em Radiologia do Estado de São Paulo
Sp-Warria Werken
Terra Livre - Movimento Popular do Campo e da Cidade
Tribunal Popular
Unidos Pra Lutar
Conheci Don Pedro Casaldáliga na década de oitenta, no encontro nacional das CEBs em Trindade. Nessa época ele já era bispo de São Felix do Araguaia, conhecido por sua luta, respeitado e amado pelo povo desprotegido que corajosamente defendia. Escutá-lo, em palestras ou celebrações, foi um privilégio. Se nada conhecesse da espoliação, exploração e lenta dizimação que os povos indigenas vem sofrendo há 500 anos, bastaria saber que este homem está apoiando sua causa para ter certeza de que é rigorosamente justa.