ALMG sedia audiência pública da Câmara dos Deputados para debater PEC 90, que trata do transporte como direito social.
Parlamentares federais envolvidos com a tramitação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 90/11, que propõe a inclusão do transporte público como direito social garantido pela Constituição da República, esperam que já no próximo ano a proposição venha a ser aprovada no Congresso Nacional. Essa foi a expectativa manifestada na tarde desta quinta-feira (31/10/13) pela autora da proposição, deputada Luiza Erundina (PSB-SP), durante audiência pública da Comissão Especial da Câmara dos Deputados destinada a emitir parecer sobre a PEC. A reunião foi realizada no Plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), representada na mesa pelo deputado Paulo Lamac (PT).
A audiência contou ainda com a participação dos deputados federais Marçal Filho (PMDB-MS) e Nilmário Miranda (PT-MG), respectivamente presidente e relator da Comissão Especial da PEC 90, que compartilharam com Erundina a mesma expectativa sobre a aprovação da matéria em 2014. Todos destacaram o papel do Movimento Passe Livre, que deu origem às grandes manifestações de junho, em todo o País, para que a PEC, proposta por Erundina há dois anos, avançasse na pauta do Congresso. “Essa conquista nós também devemos aos jovens do Movimento Passe Livre”, disse Erundina, ressaltando que a PEC é de extrema relevância social, considerando que o transporte público consome cerca de 30% do orçamento do trabalhador.
A audiência em Belo Horizonte foi a terceira de cinco reuniões promovidas pela Comissão Especial. As duas primeiras foram realizadas em São Paulo e Brasília. As próximas estão marcadas para os dias 7 de novembro, em Campo Grande, e 14 de novembro, no Rio de Janeiro. O objetivo é colher informações e depoimentos da área técnica e de movimentos sociais para a formulação de relatório que será submetido à Comissão Especial e, quando aprovado, encaminhado ao Plenário da Câmara dos Deputados.
Valor social - A PEC propõe alterar a redação do artigo 6º da Constituição da República, com a inclusão do transporte como um direito social, condição hoje prevista para educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Com a inclusão, o tema transporte passará a merecer tratamento diferenciado como valor social, direito do cidadão e sujeito a políticas públicas específicas.
Segundo a deputada Erundina, o transporte e a mobilidade são reconhecidos como direitos sociais até pela Carta da Organização das Nações Unidas (ONU), que completa 65 anos. “A Comissão Especial está percorrendo vários Estados, para que possamos aprovar a matéria rapidamente no Congresso, a fim de que em 2014 este direito esteja consagrado na Constituição”, disse.
O presidente da Comissão Especial, deputado Marçal Filho, também se declarou empenhado para que a PEC seja aprovada em novembro próximo, na Comissão, para que, em 2014, passe pelos dois turnos na Câmara e no Senado.
O relator, Nilmário Miranda, lembrou que o tema tem sido longamente discutido com diversas entidades do movimento social, como o Fórum Nacional da Luta Urbana, o Movimento em Defesa do Transporte Público, a Ordem dos Advogados do Brasil, entre outras. Observou ainda que o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) dispõe de estudo detalhado sobre possibilidade de financiamento da tarifa zero, uma das reivindicações do MPL.
Também participaram do evento os deputados federais Isaías Silvestre (PSB-MG) e Padre João (PT-MG), os deputados estaduais Rogério Correia e Adelmo Carneiro Leão, ambos do PT, e Liza Prado (Pros), além de vereadores da Capital e de outras cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), sindicalistas da área de transporte e representantes do Movimento Passe Livre, da BHTrans, de associações de moradores e de outras entidades. O deputado Isaías Silvestre destacou a importância da PEC e a sensibilidade da deputada Luiza Erundina ao apresentar a proposição. Ele parabenizou os parlamentares envolvidos no projeto e também o MPL.
Entidades defendem tarifa zero e acessibilidade
Na fase de debates, a proposta de tarifa zero foi defendida por diversos participantes, entre eles o representante da Assembleia Popular Horizontal, André Veloso, que destacou a importância da reforma tributária e criticou o sistema regressivo de renda, explicando que os mais pobres pagam mais caro pelos serviços. Ele repudiou o subsídio no transporte individual que, disse, “é 12 vezes maior do que no transporte coletivo”. Veloso também afirmou que a mudança não deve ocorrer somente no âmbito municipal, sendo necessária a implantação de um sistema de tarifa zero nacional e de um fundo nacional de transporte público.
Representando a BHTrans, o analista de transporte e trânsito Marcos Fontoura salientou que é essencial a participação e controle social na gestão dos recursos, defendendo a criação de um Conselho Deliberativo do Transporte Público, para que o financiamento seja gerenciado de maneira mais satisfatória.
“A questão do transporte é um direito social. Se houver vontade política e determinação do Congresso Nacional, acharemos recursos suficientes para que o transporte público seja para todos” disse o vereador de Belo Horizonte Arnaldo Godoy (PT). Ele ressaltou a importância de que o transporte coletivo seja acessível a todas as pessoas com qualquer tipo de dificuldade. Para ele, há recursos, mas é necessária iniciativa dos governos municipais, estaduais e federal.
O representante do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase, Tiago Flores, destacou que a discussão sobre mobilidade urbana engloba outras áreas que vão além do transporte. “O trânsito afeta a saúde do trabalhador, que leva muito tempo para chegar ao emprego. Muitos afastamentos estão relacionados com o estresse causado pelo trânsito”, afirmou.
A presidente do Conselho de Defesa da Pessoa com Deficiência de Minas Gerais, Kátia Ferraz Ferreira, também apontou como a discussão envolve a saúde da população. Para ela, os direitos das pessoas com deficiência não podem estar fora do debate em termos de mobilidade e desenvolvimento da cidade.
Rodoviários - Camilo Leles de Assis Moreira, secretário do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de Belo Horizonte e Região (STTR), ressaltou que a discussão não pode priorizar somente o atendimento aos usuários, mas também a situação dos trabalhadores do transporte público. “Vários motoristas e cobradores correm risco de vida ao conduzirem um ônibus sucateado. Cerca de 30% da categoria está afastada por estresse e problemas na coluna. Alguns não têm local nem para fazer suas necessidades”, denunciou, acrescentando que ocorrem aproximadamente 150 assaltos por mês, em ônibus, registrados em ocorrência policial.
O deputado federal Padre João (PT-MG) definiu como desafio dos estados e municípios a buca por vários modais de transporte, da ciclovia ao sistema ferroviário. Para ele, os modais devem atender às cidade de pequeno, médio e grande porte. “Municípios de 40 mil habitantes também têm problemas com o trânsito”, declarou.
Já o deputado Adelmo Carneiro Leão (PT) ressaltou que não basta tratar da tarifa se não se tratar de todo o sistema, como a questão da segurança e dos trabalhadores. O parlamentar pontuou ser necessário discutir e pensar em uma cidade sustentável. “Pensar a cidade é uma condição na lógica da construção da mobilidade”, afirmou.
A vereadora Terezinha Berenice de Souza, de Sabará (RMBH), enfatizou a necessidade de fortalecer o transporte público e, em particular, o transporte ferroviário, para melhorar a mobilidade urbana. Segundo ela, a aprovação da PEC 90 representa “um salto qualitativo e abre caminho para propostas que parecem utópicas, mas na realidade não são, como a questão da tarifa zero”.
O deputado Rogério Correia (PT) reafirmou a importância da PEC 90 e lembrou que as jornadas de junho trouxeram para o centro da pauta do País assuntos que pareciam esquecidos, mas não estavam, como a carência dos transportes coletivos. Lembrou que o Congresso aprovou os royalties do petróleo para a educação e saúde e o programa Mais Médicos, do Governo Federal, como resposta às jornadas de junho, e disse esperar que a mobilização pelos transportes, em nível nacional, também se fortaleça em Minas Gerais.
Parlamentares destacam nível do debate e apelam para mobilização
Ao encerrar os trabalhos, a deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP) declarou que a luta por um transporte de qualidade é uma questão de cidadania. “Um transporte acessível a todos é condição para exercer a cidadania”, disse, lembrando que as palavras cidade, cidadão e cidadania têm a mesma origem. Para ela, não há outra solução para o problema senão a reforma tributária. Ela ressaltou a importância de, em primeiro lugar, declarar o transporte coletivo como direito social e, depois, discutir o financiamento. Finalmente, declarou-se impressionada com o nível do debate na audiência da ALMG e conclamou todos a se mobilizarem e pressionarem os parlamentares no Congresso para garantir que a PEC 90 seja votada na Câmara até o final de novembro e, no próximo ano, também no Senado. “A agilidade e a eficácia dessa PEC só vai se efetivar pela expressão do poder popular”, disse.
O presidente da Comissão, deputado Marçal Filho, por sua vez, observou que a realização de audiências fora da Câmara não é uma obrigatoriedade, mas uma opção da Comissão Especial, que pretende, com isso, estender o debate e garantir a mobilização popular.
O relator, deputado Nilmário Miranda, também defendeu a mobilização, lembrando que 37 milhões de brasileiros andam a pé, por falta de dinheiro para pagar passagens, acrescentando que, em Salvador, o índice dos que não dispõem de recursos para o transporte chega a atingir 40% da população. O relator disse ainda que todas as propostas e sugestões que vêm sendo recolhidas nas audiências públicas da Comissão Especial serão consideradas no relatório final. Como os demais colegas, observou também que o debate na ALMG contribuiu para enriquecer muito o trabalho da Comissão especial.
O deputado Paulo Lamac, que acolheu os visitantes em nome do Parlamento estadual, agradeceu à Comissão Especial “por ter honrado a Casa e o Estado de Minas Gerais”, manifestou apoio à causa e falou de sua expectativa de que Estado e municípios possam dar continuidade ao debate e discutir a implantação da proposta em seus territórios.
Fonte: Assembleia Legislativa de Minas Gerais
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