sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Em meio a pedidos de justiça, Câmara devolve mandato a cassados pela ditadura

Homenagem e Devolução Simbólica dos Mandatos dos Deputados Federais Cassados por Atos de Exceção entre 1964 e 1977 - dep. Luíza Erundina (PSB-SP), autora do requerimento

Agência Câmara - foto: Gustavo Lima

Em sessão solene marcada por discursos emocionados, a Câmara devolveu nesta quinta-feira, simbolicamente, os mandatos de 173 deputados federais cassados pelo regime militar, entre 1964 e 1977, ao longo de quatro legislaturas.

O Plenário ficou lotado de deputados e familiares que expressaram, por meio dos olhos marejados, o sentimento de reparação e justiça que aconteceu no mesmo plenário onde, nas décadas de 60 e 70, sofreram as injustiças do arbítrio e da falta de liberdade. Dos 28 parlamentares ainda vivos, 18 compareceram à cerimônia, e os outros foram representados por familiares e amigos.

Na abertura da sessão, o presidente da Câmara, Marco Maia, disse que a solenidade foi um ato que busca “apagar a nódoa causada pelos gestos autoritários que muito nos envergonha”. Ele lembrou que os deputados cassados foram calados “não pelo debate, mas pela imposição e pela força do regime”.

A presidente da Comissão Parlamentar Memória, Verdade e Justiça, deputada Luiza Erundina (PSB-SP), definiu a solenidade como uma forma de restabelecer a soberania do voto popular, “usurpado pelo regime de força que perdurou por 20 anos”. A comissão iniciou o estudo sobre o período e preparou a solenidade.

Não ao arbítrio
Erundina – que solicitou a sessão solene juntamente com o deputado Eduardo Gomes (PMDB-TO) - frisou que a Câmara foi a instituição mais atingida pela ditadura com seus atos institucionais. Para ela, houve um ataque de intimidação contra a representação do povo brasileiro, e a devolução de mandatos é “uma justiça a essas pessoas que tiveram a coragem de dizer não ao arbítrio”.

A deputada defendeu a revisão da Lei de Anistia (Lei 6.683/79) e a aprovação do Projeto de Lei 573/11, que exclui da anistia os agentes públicos que cometeram crimes durante a ditadura militar.

Para o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, deputado Domingos Dutra (PT-MA), foi graças a brasileiros como os deputados cassados que o Brasil elaborou uma Constituição chamada de cidadã. Dutra acrescentou que eles também deixaram como legado um Congresso que funciona livremente, uma imprensa livre e um Judiciário democrático, além da eleição de “um operário e uma mulher” para o cargo de presidente da República, em referência ao ex-presidente Lula e à presidente Dilma Rousseff.

Dutra citou desafios para o Congresso, como encontrar os corpos das pessoas mortas pela ditadura, rever a Lei da Anistia, garantir os direitos dos povos indígenas e dos quilombolas e combater a violência urbana. “Apesar de a estrada ser longa e penosa, esta sessão solene faz aumentar nossa autoestima e a confiança em um Brasil justo e fraterno”, declarou.

Reparação necessária

O presidente da Comissão Nacional da Verdade, ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles, disse que o reconhecimento oferecido pela Câmara aos deputados cassados pela ditadura é uma indicação de que uma reparação precisa ser feita. Ele participou da solenidade de devolução simbólica dos mandatos no Plenário Ulysses Guimarães.

“A verdade, para mim, pressupõe integridade, e o que vemos aqui é o resgate de pessoas que se comprometeram com sua própria integridade”, disse Fonteles, sobre os deputados cassados por desentendimentos com o governo autoritário.

Em um discurso emotivo, Fonteles propôs um pacto entre as gerações que viveram o período de exceção e as futuras gerações. “Que nunca mais venhamos a permitir que nossas divergências sejam decididas pelo arbítrio, pela truculência e pelo desaparecimento”, disse.

Para a ministra da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, a restituição simbólica dos mandatos é um momento que fica para a história como atitude de reconhecimento e de reparação “àqueles que empenharam suas vidas em defesa da democracia”.

Maria do Rosário, que é deputada federal licenciada, lembrou que o juramento prestado pelos parlamentares na recuperação dos mandatos é, na verdade, um juramento à democracia e o compromisso para que “jamais permitam que a democracia, a justiça e a paz sejam aviltadas como foram no golpe de 1964”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário