quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Entrevista ao Jornal GGN - Reforma Política



A deputada federal Luiza Erundina tem uma longa trajetória e pode discorrer sobre pontos da reforma política como poucos. Em entrevista exclusiva ao Jornal GGN, Erundina considera que o PLS 441/2012, é “um remendo à lei eleitoral, sem qualquer relevância e servem apenas para acomodar interesses específicos e desviar a atenção do que é essencial”.

Erundina assumiu seu primeiro cargo público em 1958, como Secretária de Educação de Campina Grande, na Paraíba. Perseguida pela ditadura, muda-se para São Paulo em 1971. Em 1980 participa da fundação do PT e, em 1982, elege-se vereadora da cidade de São Paulo. Quatro anos depois é eleita deputada estadual e, em 1988, elege-se prefeita da maior cidade da América Latina, São Paulo, pelo PT. Este feito a torna a primeira mulher a assumir o cargo na capital paulista. Em 1993 é nomeada ministra da Secretaria da Administração Federal, no governo de Itamar Franco. E, em 1998, é eleita deputada federal por São Paulo, pelo PSB.

Atualmente está no seu quarto mandato como deputada federal e é coordenadora da Frente Parlamentar pela Reforma Política com Participação Popular que, luta por uma reforma política ampla, capaz de corrigir as graves distorções do sistema partidário e eleitoral e coibir os desvios éticos que têm marcado historicamente, a vida política brasileira. Coordena também a Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação com Participação Popular (Frentecom), onde, dentre os principais pontos tratados, estão a garantia do exercício da liberdade de expressão e do direito a comunicação, além da reformulação do Marco Regulatório do setor. Destaca-se ainda na luta pela ampliação da participação das mulheres na política, pela democratização dos meios de comunicação no Brasil e pela reforma do sistema político brasileiro.

Eis a íntegra da entrevista concedida pela deputada Luiza Erundina ao Jornal GGN.

Jornal GGN -  Quais os principais aspectos de uma Reforma Política que atenda os anseios da sociedade brasileira?


Luiza Erundina - Entendo que uma verdadeira reforma política não deve se restringir a simples mudança de regras eleitorais, que é o que tem ocorrido e que não atende aos legítimos anseios da sociedade brasileira, pois não corrige as graves distorções do atual sistema político.

Destaco aqui os principais aspectos que, no meu entendimento, devem ser contemplados por uma proposta de reforma do sistema político como um todo:

- substituir o sistema uninominal de votação por votação em lista, com alternância de gênero;

- financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais;

- fim de coligações partidárias nas eleições proporcionais;

- adoção de voto revogatório ou “recall”;

- regulamentação do artigo 14 da Constituição Federal para efetivar o exercício da democracia direta ou participativa;

- revisão da Lei Orgânica dos Partidos Políticos, no sentido de fortalecê-los em termos de identidade ideológica, programática e política.

- adoção de regras de fidelidade partidária.

Outros aspectos poderiam ser acrescentados, porém a aprovação dos aqui citados traria mudanças significativas para a qualificação do processo político eleitoral e consolidação da democracia.

Jornal GGN -  Quais os principais problemas na representatividade política e quais projetos poderiam minimizar essa fresta dentro do sistema político atual?

Luiza Erundina - Há praticamente um consenso na sociedade brasileira sobre a crise de legitimidade e de representatividade dos representantes do povo, conforme demonstram os índices de pesquisa, e cujas causas destacaria:

- influência do poder econômico nos resultados das eleições;

- coligações heterodoxas entre partidos políticos sem nenhuma coerência, além de distorcer a vontade do eleitor que vota num candidato e elege um outro que não conhece;

- partidos sem identidade ideológica e sem projeto político, o que leva o eleitor a votar em pessoas e não em projetos que expressem compromissos;

- falta de exercício de democracia direta ou participativa como uma das dimensões da democracia;

- sub-representação nos espaços de poder de alguns segmentos da sociedade, tais como mulheres, negros, índios, jovens, idosos, pessoas com deficiência, entre outros.

Jornal GGN -  Além disso, quais as mudanças estruturais que esse projeto apresenta e como ele se diferencia dos demais que tramitam no Congresso Nacional?

Luiza Erundina - Existem vários projetos tramitando no Congresso Nacional. Porém, nenhum deles propõe mudanças estruturais. Para tanto seria necessário uma proposta de reforma, não apenas do sistema político-eleitoral-partidário, mas do Estado.

O mais completo é o que em 2009 foi apresentado pela Frente Parlamentar pela Reforma Política com Participação Popular, através da Comissão de Legislação Participativa (CLP), e que está pendente de votação nessa Comissão para em seguida tramitar nas demais Comissões e ser votado pelo plenário da Câmara dos Deputados.

Recentemente, várias entidades da sociedade civil formaram a “Coalizão pela Reforma Política  Democrática e Eleições Limpas”, que elaborou uma proposta de reforma com os seguintes pontos:

1 – implantação do financiamento público para as campanhas eleitorais;

2 – proibição de financiamento eleitoral por pessoas jurídicas;

3 – permissão de contribuição individual, obedecendo ao teto de setecentos reais por eleitor e não ultrapassando o limite de 40% dos recursos públicos recebidos pelo partido destinados às eleições;

4 – extinção do sistema de voto dado ao candidato individualmente, como hoje é adotado para as eleições legislativas;

5 – adoção do sistema eleitoral do voto dado em listas pré-ordenadas, com alternância de gênero, formadas pelos partidos e submetidas a dois turnos de votação (o eleitor primeiro vota no partido e depois escolhe um dos nomes da lista);

6 – regulamentação dos instrumentos de democracia direta ou democracia participativa, previstos no art. 14 da Constituição.

Essa proposta constituir-se-á em um projeto de lei de iniciativa popular, desencadeando-se ampla campanha para coleta das assinaturas necessárias à sua apresentação ao Congresso Nacional.

Jornal GGN -  Há inúmeros projetos sobre Reforma Política tramitando no Congresso. Por que uma matéria de ampla importância para a democracia do país ainda não foi aprovada, o que impede?


Luiza Erundina - Há várias razões para isso. A principal delas é o fato de que, ao votarem uma dada proposta de reforma, os parlamentares levam em conta, antes de tudo, o quanto as mudanças facilitarão ou não sua própria reeleição.

Os partidos, por sua vez, também não concordam em modificar um sistema que lhes tem sido favorável, salvo se a mudança lhes trouxer ainda mais vantagens. Sendo assim, não se consegue formar maioria para aprovar qualquer proposta.

Jornal GGN -  Em março último, a deputada questionava a falta de articulação entre a Câmara dos Deputados e o Senado Federal sobre o encaminhamento da Reforma Política. Como a deputada avalia o atual cenário?

Luiza Erundina - De fato, naquele momento havia um aparente descompasso entre as duas Casas. No entanto, a disputa não era real. Ambas estavam interessadas, não numa reforma política para valer, mas numa simples mudança de regras eleitorais que facilitasse a vida dos candidatos, partidos e financiadores de campanhas. Tanto é que unificaram suas posições em torno de uma única proposta de minirreforma eleitoral que agrava ainda mais as distorções existentes.

Jornal GGN -  O projeto levanta pontos sensíveis quanto ao financiamento de campanha, entre eles o repasse exclusivo de recursos públicos. Em sua avaliação como os parlamentares, responsáveis pela aprovação dos projetos de lei irão enfrentar essa proposta?

Luiza Erundina - O financiamento ao mesmo tempo público e privado das campanhas é uma das mais graves distorções do atual sistema eleitoral. Por isso precisa ser enfrentado de uma vez por todas. E não há outra saída que não seja o financiamento público exclusivo com um teto e mecanismos eficazes de fiscalização e controle.

É evidente que a maioria dos parlamentares não concorda, pois estão acostumados a contar com grande quantidade de recursos obtidos junto a financiadores privados, que depois são ressarcidos por meio de emendas orçamentárias. Portanto, é uma questão que mais divide opiniões entre os parlamentares e de difícil compreensão por parte da sociedade.

Jornal GGN -  Qual a importância da adoção de listas partidárias preordenadas para as eleições, em especial para os brasileiros?


Luiza Erundina - Essa seria uma medida de extrema importância para o fortalecimento dos partidos políticos e para a qualificação do voto, pois este seria dado a uma proposta de programa partidário que expressasse compromissos e não a um candidato, o que coibiria o personalismo e o clientelismo político, além de baratear as campanhas eleitorais e evitar que candidatos de uma mesma legenda disputassem entre si o voto do eleitor.

Defende-se, também, a lista preordenada com alternância de gênero com vistas a corrigir a sub-representação das mulheres nos espaços institucionais de representação política e em outras instâncias de poder da estrutura do Estado.

Objeções ao sistema de voto em lista preordenada são invocadas. Alega-se, por exemplo, a concentração de poder nas cúpulas dos partidos. Mas é justamente o atual sistema político partidário e eleitoral que gera coronelismo e autoritarismo das direções partidárias.

Registre-se ainda que o voto em lista é adotado nas principais democracias do mundo, caracterizadas pela estabilidade de suas instituições políticas.

Jornal GGN -  A deputada acredita que a destinação do tempo de propaganda partidária para ações afirmativas impulsionará a participação dos setores subrepresentados de nossa sociedade?

Luiza Erundina - Ações afirmativas não são um fim em si mesmas, mas, medidas necessárias no enfrentamento das discriminações que existem na sociedade contra determinados segmentos. É o caso da exclusão das mulheres dos espaços de poder. Sua participação na propaganda partidária as tira da invisibilidade e possibilita sua capacitação no uso dos meios de comunicação social, condição indispensável à atividade política.

Jornal GGN -  Quais as considerações sobre o PLS 441/2012 que tramita nas duas Casas?

Luiza Erundina - O PLS 441/2012 veio do Senado e foi aprovado pela Câmara com alterações, por isso teve que retornar ao Senado. Trata-se de um remendo à lei eleitoral, sem qualquer relevância e servem apenas para acomodar interesses específicos e desviar a atenção do que é essencial.

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